Você lembra do programa “Mais Médicos”, criado em 2013 durante o governo de Dilma Rousseff? A ideia consistia em contratar médicos para atuarem em regiões de atendimento médico precário, com a ideia de reduzir a demanda por médicos em regiões carentes.
Pois bem, o programa já foi assunto aqui no UBQ na ocasião de seu lançamento. Eu publiquei um texto sobre o projeto e também sobre a proposta de criar uma espécie de estágio obrigatório para o recém-formados em medicina (tem um texto bacana do Michel também sobre o assunto). No caso do estágio, este não foi à frente.
Já o ‘Mais Médicos’ seguiu em frente e foi ampliado…
Só para relembrarmos, é importante sabermos os principais pontos do programa:
- O programa contrataria em caráter emergencial médicos para atuarem em municípios do interior e periferias das grandes cidades de modo a suprir a carência de profissionais
- Haveria o pagamento de uma bolsa de cerca de R$ 10 mil, além da cobertura de despesas com habitação e alimentação
- A contratação seria de forma provisória e haveria uma prioridade na contratação para:
- Médicos formados no Brasil
- Médicos brasileiros formados no estrangeiro com diploma revalidado no Brasil.
- Médicos brasileiros formados no estrangeiro sem diploma revalidado (neste caso haveria dispensa da validação num primeiro momento)
- Médicos estrangeiros com diploma revalidado no Brasil
- Médicos estrangeiros sem diploma revalidado no Brasil (novamente neste caso, haveria dispensa da validação num primeiro momento)
- Apesar de haver uma dispensa inicial da validação do diploma aqui no Brasil, mas os inscritos aprovados nesta situação teriam um registro provisório e posteriormente deveriam providenciar a validação do documento.
- Ainda no caso dos médicos estrangeiros, só poderiam ser contratados estrangeiros de países com proporção de médicos por mil habitantes inferior à média brasileira (na ocasião, a proporção era de 1,8)
- Haveria um regime diferenciado de contratação para os médicos cubanos:
- A contratação seria feita com intermediação da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS)
- O pagamento dos profissionais seriam feitos a OPAS que repassaria integralmente os valores para o governo cubano. Este reteria 75% dos valores pagos e repassaria o restante aos profissionais.
Bom, em linhas gerais esse é o programa… em 14/11/2018, o ministério da saúde cubano informou que está se retirando do programa por considerar as declarações ‘ameaçadoras e depreciativas’ feitas pelo presidente eleito Jair Bolsonaro. A informação consta no site do Estadão e também em outros veículos de imprensa.
Mas será que as declarações do Bolsonaro foram tão ameaçadoras assim?
Vejamos…
Condicionamos à continuidade do programa Mais Médicos a aplicação de teste de capacidade, salário integral aos profissionais cubanos, hoje maior parte destinados à ditadura, e a liberdade para trazerem suas famílias. Infelizmente, Cuba não aceitou.
— Jair M. Bolsonaro (@jairbolsonaro) 14 de novembro de 2018
Então, colocando de modo claro, temos que:
- Aplicação de teste de capacidade… entendo tratar-se do processo de revalidação, que é algo já previsto no programa.
- Pagamento integral do salário aos médicos cubanos… afinal de contas, são eles que estão exercendo a função de médicos e não o governo cubano.
- Permitir a vinda de familiares dos médicos ao Brasil… bom, Cuba não é ali na esquina. Em uma democracia, qual seria o problema disso?
Agora, eu pergunto: qual é o crime nesta propositura?
Mais uma vez, quero deixar claro que não sou militante do PSL ou do Bolsonaro… mas eu estou apenas me restringindo as condições estipuladas. Qual o crime nisso? Qual a violação à democracia?
Em minha visão, da forma como foi concebido, o programa não passa de um paliativo que não resolveu o problema da saúde no Brasil. E existem vários indicadores disso:
Reportagem de “O Estado de São Paulo” de 06/08/2015:
Reportagem de “O Estado de São Paulo” de 19/09/2015:
Reportagem de “O Estado de São Paulo” de 19/09/2015:
Também não podemos nos esquecer que dentro deste plano chamado ‘Mais Médicos’ previu-se a criação de mais vagas em cursos de medicina
Reportagem de “O Estado de São Paulo” de 10/07/2015:
E é claro, que isso foi feito no melhor estilo ‘nas coxas’:
Reportagem de “O Estado de São Paulo” de 20/07/2015:
Pois bem… volto a dizer que o Bolsonaro não cometeu nenhuma monstruosidade ao solicitar garantias quanto à formação dos profissionais médicos, ao solicitar o pagamento integral aos profissionais e ao solicitar que os familiares possam vir ao Brasil.
Mas também acho que é importante criar garantias que pode suprir o buraco que será deixado. Infelizmente, o lulopetismo criou uma relação de financiamento institucional ao governo cubano, alugando mão-de-obra da ilha de Fidel. O que Bolsonaro propôs foi simplesmente acabar com a farra.
Acho que a saída de Cuba do programa – na forma como está – é positiva. Estamos eliminando uma via de financiamento velado. Entretanto, o futuro governo deve pensar em um plano de contingência para suprir a demanda. Melhorar as condições de atendimento médico na saúde pública passa pela melhor remuneração dos médicos, enfermeiros, assistentes sociais, psicólogos e profissionais correlatos. Melhorar a formação destes profissionais, melhorar a infra-estrutura existente. Enfim… não é somente contratar mão-de-obra. É necessário reestruturar a saúde.
Em tempo… observando a repercussão da notícia, deparei-me com a seguinte colocação em uma rede social:
Em primeiro lugar, é importante deixar claro que a saída do governo cubano não implica no fim do programa ‘Mais Médicos’. De acordo com os dados do próprio programa, são 18.240 vagas. São cerca de 8.300 médicos cubanos. Admito que é um grande contingente… mas não é o todo.
Segundo… está havendo uma inversão de valores. Cabe ao povo observar, fiscalizar e cobrar o governo por soluções para as demandas do povo. Isto é óbvio.
Mas o governo não pode ser conivente com um ‘acordão’ ideológico partidário. O povo continuará comprando seu pão… cabe ao governo encontrar os fornecedores corretos para os ingredientes e principalmente fiscalizar o fabricante do pão.
No final das contas, parafraseando com adaptações opinião publicada no jornal “O Estado de São Paulo” em 02/04/2015, bom mesmo, era para Cuba.
[ Links interessantes para saber mais ]
- Entenda como funciona os mais médicos (‘Folha de São Paulo’ de 14/11/2018)
- Se médicos cubanos forem embora, quando chegarão os próximos? (‘BBC Brasil’ de 14/11/2018)
Mais Médicos: O que disseram Cuba e Bolsonaro sobre a saída dos cubanos do programa (‘BBC Brasil’ de 14/11/2018)
Médicos cubanos se surpreendem com decisão de rompimento de parceria no Mais Médicos (portal ‘Estadão’ em 14/11/2018)
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