23 de abril de 2014

Vamos falar sobre música?

Buenas,

Sou o novato aqui. Meu nome é Junior Ferreira e fui convidado pelo meu grande brother, o Ricardo Marques pra escrever aqui pro UBQ. Como ele me deu carta branca pra que eu escrevesse sobre o que me "viesse a veneta", resolvi escrever sobre algo que me fascina e norteia a minha vida desde a mais tenra idade, a melhor companhia que qualquer ser pensante, e "sentinte" (neologismos, sempre!!!), possa querer, a MÚSICA.

Meu gosto musical (que por se tratar do MEU gosto, considero bom pacas, mas sempre haverão controvérsias, e que assim seja, pois senão a mesa redonda de filósofos de boteco perderia um dos grandes assuntos) não é dos mais comuns, mesmo se tratando de rock'n'roll. Pode parecer clichê falar de rock, mas tenho verdadeira paixão por coisas que ainda não foram descobertas, sim, sou um neófilo, ou como prefiro chamar, um garimpeiro musical.


Pôxa, falo no parágrafo anterior que meu gosto não é dos mais comuns e falo em seguida que gosto de rock, cadê a esquisitice? Milhões de pessoas gostam de rock, e ai? Ok, concordo em gênero, número e grau, mas quantos dos seus amigos que escutam rock, tem a "pachorra", a paciência de ficar caçando coisas que provavelmente ninguém conhece e se empolgar como criança ao saber que no outro lado do mundo, lá na longínqua Bielorrússia (ou Belarus, no idioma deles), existe uma cena roqueira da melhor qualidade, e que por lá eles fazem o melhor post-punk de que temos notícia? Pois é, eu disse que poderia soar bizarro aos ouvidos alheios. Inclusive pra mim, a princípio, soou bizarro, banda de rock da Bielorrússia? Vocês estão de brincadeira!!! Mas a curiosidade sempre fala mais alto e arrisquei.

Uma cesta de 3 pontos do meio da quadra a um segundo do fim do jogo... Chuá!!!

A primeira banda de lá a ganhar a minha atenção foi o Akute (o pior é falar da banda pros amigos que te olham com aquela cara de "Você bebeu?" e nem saber se a pronúncia do nome como ando dizendo está correta. Pronuncio do jeito que lemos em português mesmo.). Banda oriunda da cidade de Mogilev e que conta em sua formação com: Raman Žyharau (baixo e vocais), Stas Mytnik (voz e guitarra), Pavel Filatov (bateria).

O Akute, é uma clássica banda de post-punk. Ao ouvi-los, senti-me em Londres, início dos anos 80, aquela safra magnífica de bandas: Joy Division, The Cure, Wire, Echo & the Bunnymen, e tantas outras. Uma sonoridade revisitada com um talento sensacional que faz com que o som não soe datado, mesmo estando óbvias as referências. No caso do Akute, nota-se claramente a influência gigantesca do Joy Division, uma sonoridade mais soturna, com bateria dançante, baixo bem marcado e guitarras criativas e barulhentas. A voz, é um caso à parte. Primeiro por cantarem em seu idioma pátrio (impossível cantar junto!!!) e segundo porque provavelmente eles coloquem alguma coisa na água daquele povo, ou mais provavelmente, a quantidade de vodka que consomem por lá, faz com que todos fiquem com um timbre parecido com o do Ian Curtis (vocalista do Joy Division, morto em 1980).

Eles tem 2 discos lançados, o primeiro chama-se "Dzievacki i Kosmas" e é de 2011 e o segundo e mais recente, chama-se "Nie isnuje" e é de 2012. O disco que mudou a minha opinião sobre o rock feito do outro lado do mundo, foi o de 2012, e que grata surpresa. Começa incendiário, com "Krou by vada", faixa que já coloca os saudosistas pra chacoalharem o esqueleto no baile, e que ao mesmo tempo consegue ser dançante e vigorosa, com um final épico. Conforme as faixas vão passando o disco se mostra ao mesmo tempo retrô e moderno. Não ouço só passado no som dos caras, ouço resquícios de coisas atuais como "the Killers" em "Jany pad snieham". Talvez o resquício mais oitentista e descaradamente retrô esteja em "Špital". Mesmo com alguns elementos eletrônicos e modernos, o som dos caras é calcado na década de 80 e isso, em momento algum soa pejorativo, é uma das maiores virtudes dos caras, estruturar-se e conceber algo novo baseando-se em algo que já tinha sido feito anteriormente (provavelmente quando nenhum dos caras da banda era nascido).

Fica difícil apenas conceituar, é muito mais fácil deixar a iguaria pra que vocês apreciem. O link pro álbum dos caras tá aqui: https://soundcloud.com/akute/sets/nie-isnuje/


Outra banda a chamar a minha atenção foi o Blackmail (ao menos nesse caso, sei que a pronúncia do nome está correta). Não soam tão estranhos quanto o Akute, pois cantam em inglês. São da cidade de Minsk e contam em sua formação com: Maxim Kulsha (voz e guitarra), Yurii Skopets (guitarra), Alexandr Sinica (baixo) e Arthur Granik (bateria). Soam mais modernos, fazem o chamado "post-punk revival", o mesmo de algumas bandas estadunidenses do começo dos anos 2000, como Interpol e She Wants Revenge. Embora as influencias sejam as mesmas dos estadunidenses, o Blackmail tem uma qualidade enorme e faz um som cheio de identidade.

Eles tem 2 discos lançados, o "Blackmail EP" de 2009 e o "New Ritual" de 2011. Ambos são de um bom gosto ímpar. Bem produzidos, com uma sonoridade que foge totalmente do óbvio, e que provavelmente teria estourado no mundo todo, caso fossem estadunidenses ou ingleses, mas a cena bielorrussa AINDA não foi descoberta pelo grande público consumidor de rock'n'roll, o que é uma pena. Quem sabe não esteja ajudando a mudar essa história (pretensão à parte).

Entre seus dois lançamentos, o EP de 2009 me ganhou. Mais curto, mais coeso, mais cru, provavelmente pela inexperiência da banda que evoluiu de um disco pra outro, o "New Ritual" é melhor produzido, mas  me amarro na crueza do "EP". Vejo nele lampejos de Interpol, principalmente na voz. Suas músicas tem um clima bem soturno, as guitarras são muito bem trabalhadas (em algumas vezes chegam a lembrar o U2 do começo, com vários harmônicos como em "Captain of Lonely Heart" ), o baixo tem um timbre extremamente grave (e isso é lindo!!!) e a bateria é minimalista, sem comprometer a qualidade do som. Em "Carnival" podemos notar a maior semelhança com as bandas estadunidenses, embora isso não seja demérito algum, mas nada soa como cópia ou como releitura, mostra apenas que os bielorrussos estavam antenados com o que ocorria musicalmente à época, ponto pra eles. Estavam sim na hora certa, mas como o local não tinha visibilidade, passaram despercebidos, uma pena, pois são uma banda sensacional.

O Blackmail pode ser ouvido nesse link (embora não consegui um link pro "Blackmail EP" disponível em streaming): http://theblackmail.bandcamp.com/


Dessa primeira leva de descobertas bielorrussas, o último achado foi o "The Praga". Também cantam em inglês, mas soam bem mais barulhentos que as outras duas bandas, ainda assim soam post-punk pra caramba. Também são de Minsk e tem em sua formação: Denis (voz e guitarra), Pavel (baixo e voz) e Anton (bateria).

Eles tem alguns singles lançados de maneira isolada, mas um deles, um maxi-single de 3 músicas chamado "My Summer", me chamou muito a atenção. A voz é cavernosa de tão soturna que é, mas a sonoridade é de uma urgência, de um desespero tão grande que tem horas que chega a soar claustrofóbico, e essa é a maior qualidade deste disquinho. Das 3 bandas, o "The Praga" é a mais diferente (sonoramente falando). Faz um som muito mais puxado pro "shoegaze" do que pro post-punk, embora sejam claros todos os clichês do estilo no som dos caras: guitarras trabalhadas e criativas (embora aqui, mais barulhentas que as demais), baixo cadenciado, com ritmo e peso, a bateria minimalista e a voz grave.

Nesse single, tudo é feito no capricho. A produção é primorosa, a construção e execução das músicas é de um bom gosto fora do comum, tudo soa bem aos ouvidos. A abertura com "My Summer" é o que mais se aproxima do post-punk "de raiz", com traços de Joy Division no andamento e na voz, mas a nova geração aparece por aqui, a bateria dançante aparece em algumas partes. Mesmo não sendo tão post-punk como as outras duas bandas, ainda é um bocado post-punk (está complexa essa explicação, eu sei, mas tem todos os elementos, a sonoridade e a atmosfera, mas soa diferente dos clichês). A segunda faixa, "Divorce", é a mais oitentista do disco. Guitarras cheias de efeitos, soando bem melódica no começo, até explodir em distorção no que costumamos chamar de refrão. Mesmo mantendo o "esporro sônico" a voz continua pomposa e soturna (como se nada tivesse acontecido, como se a música continuasse na calmaria, e não no tsunami  que se transforma), e essa dualidade é a cereja do bolo, torna essa música surpreendente. Boa demais! A última faixa, "Empty Rooms", também com instrumental calcado nos anos 80 (guitarras minimalistas, baixo marcado e bateria vigorosa), caberia numa boa, no repertório de quaisquer boas bandas da época, o que faz com que sejam ótimos representantes do que se propõem a fazer, o fazem muito bem feito.


Claro que existem mais bandas na cena musical bielorrussa, mas nesse primeiro momento, foram essas três que me chamaram mais a atenção. Conforme forem surgindo outras coisas boas (na Bielorrússia ou em qualquer outro lugar), compartilho aqui com vocês. Espero que se divirtam e se surpreendam. Boa viagem com os roqueiros bielorrussos.

Logo menos, tem mais!!! 

18 de abril de 2014

O sete pecados capitais: A inveja

“Ciúme é querer manter o que se tem. Cobiça é querer o que não se tem. Inveja é querer que o outro não tenha.”
Zuenir Ventura
“É tão natural destruir o que não se pode possuir, negar o que não se compreende, insultar o que se inveja.”
Honoré de Balzac
cracha
Toca o despertador… são sete horas. Ainda é madrugada… segundo os critérios de horário definidos por Paulinho. Mas hoje é dia importante. Paulinho então levanta.
Lentamente, começa o seu ritual de todos os dias: olha pela janela para ver como está o tempo. Olha para a cadeira para ver se dona Gertrudes deixara sua roupa pronta e passada. Um terno preto, camisa branca, uma gravata de dois tons em azul.
O copo com água da moringa. Seu dia não começava sem um copo com água. Normalmente seu dia começava lá pelas 10h30. Hoje seria diferente.
Hoje Paulinho teria seu primeiro dia como funcionário da empresa de seu tio Libório. Não um funcionário qualquer… assistente.  Assistente do contas a pagar. A posição fora conquistada graças a alguns favores que seu tio devia à mãe de Paulinho. Pesou também o diploma que o Paulinho conquistara. Era agora um administrador de empresas formado. Faculdade de cidade pequena, era bem verdade. Mas graças ao trabalho da mãe na livraria da cidade, conseguira uma bolsa de estudos.
Após a formatura tentou trabalhar na contabilidade do Aguiar. Bastaram dois meses para Paulinho perceber que o seu Aguiar não era um visionário. E a posição de contínuo dentro da organização não era a mais adequada para um administrador.
“Bom mesmo era o emprego do Márcio” – pensou.
Márcio era seu amigo mais próximo na faculdade. Ao contrário de Paulinho, já trabalhava na faculdade como auxiliar de áudio-visual. O trabalho não era o melhor do mundo, tampouco a remuneração. Mas era suficiente para pagar as despesas da faculdade. Márcio não era bolsista e gastava quase todo o salário com a faculdade.
Com a formatura, Márcio pode se inscrever em um concurso da prefeitura e conseguiu uma vaga na secretaria de administração. Quase o triplo do salário anterior. E os benefícios… benefícios!
Enquanto tomava sua água, pensava que talvez pudesse acertar com o tio um horário mais flexível. Afinal, um assistente deve ter algum tempo livre para poder estabelecer contatos profissionais. Convenceria o tio com o argumento de que um bom assistente é aquele que tem networking.
Dois dias atrás, ele e Márcio estava fazendo compras no magazine Lourenço. Ambos precisavam de ternos e sapatos por conta de suas novas posições. Márcio estava preocupado pois não sabia se poderia comprar dois ternos pelo crediário. Como era verão, optou por comprar duas calças e quatro camisas. Optou por apenas um paletó e um sapato. O resto teria que esperar ainda uns dois meses, até receber seu pagamento. Paulinho usou o crediário da mãe. Comprou três conjuntos completos, dois sapatos e ainda uma calça jeans para os finais de semana.
– Sabe como é… Preciso causar boa impressão ao tio Libório. Logo ele se dará conta do bom negócio que fez em me contratar. É uma questão de tempo até ser gerente. Você vai ver!
– Não seria melhor você conversar com seu tio antes? Sei lá, não acha que terno e gravata é um pouco exagerado para trabalhar em uma fábrica de torneiras?
– Qual é… você vai usar terno e gravata no seu trabalho. Somos administradores… temos uma imagem para conservar.
– Sim, mas no meu caso o terno é uma exigência da função. Inclusive tem um pessoal na prefeitura brigando para mudar isso. Cidade pequena… não tem sentido trabalhar engravatado. Ainda mais com esse calor todo!
“Márcio não sabe o que está dizendo” – pensou. “Uma sala só para ele, mesa, computador, horário para almoço, telefone com ramal… o mínimo que ele poderia fazer era ir até Ribeirão e comprar seus ternos no shopping da cidade.”
– Você deveria ter ido à Ribeirão, comprar seus ternos no shopping. O que irão pensar de vocês com estes ternos aqui do Lourenço?
–  O mesmo que irão pensar do prefeito… ele é cunhado do Lourenço. E compra suas roupas aqui.
– Ridículo! Ele deveria ir até a capital e comprar suas roupas por lá. Ele é prefeito da cidade! Prefeito!
– Paulo… ele é prefeito de uma cidade de 15 mil habitantes… não o governador do estado. Só o que ele gastaria com a viagem torraria metade de sua verba de gabinete.
“Pobre Márcio… pensa pequeno”
– Preciso ver também um celular para mim. Destes com agenda de compromissos, aplicativos. Um igual ou melhor que o do Prof. Siqueira.
– Paulo, o Siqueira dá aulas em três cidades diferentes. Você vai almoçar na sua casa e trabalhar há 10 minutos a pé de lá. Para que você precisaria de um celular?
– Ora, Márcio! E se der algum problema com algum pagamento? Tenho que estar disponível para resolver.
Paulinho agora estava no banheiro. Tomou banho rápido e morno. “Para ficar bem disposto”, era sua teoria. Na mesa, o celular de quase R$ 500 ainda estava carregando. Não era exatamente igual ao do Prof. Siqueira, mas era o que o crediário de sua mãe permitia.
Vestiu seu terno, calçou os sapatos… “Um relógio… precisarei de um com pulseira de couro para combinar com o terno”. Desceu para mesa do café. Sua mãe já tinha saído, mas deixara café quente na garrafa térmica, pão e frios. Além de um bilhete desejando boa sorte.
Paulinho comeu rápido. Já era quase 07h40. Pegou sua pasta vazia, colocou ali uma agenda de compromissos, sua carteira e seu celular. E saiu pela rua.
No caminho viu que muita gente já havia tinha saído para trabalhar. Passou em frente à casa do Márcio. Ele ainda não saíra para trabalhar. Entrava apenas as nove da manhã na repartição. Ele varria a calçada.
– Muito bem, Dr. Paulo! Quanta elegância! Está pronto para conquistar o mundo das torneiras?
– Claro… eu me preparei para isso nos últimos cinco anos! A vice-presidência é uma questão de tempo.
Riram a valer. Márcio sabia que o negócio de torneiras do Libório não era muito grande e que Paulo havia sido contratado mais como um favor do que uma necessidade. O Atílio que cuidava das coisas do banco para a fábrica era mais do que suficiente, mas em alguns anos ele iria se aposentar. “Quem sabe o Paulo não se ajeita por ali?”.
Combinaram de almoçar juntos.
Ao chegar na pequena fábrica, Paulinho foi logo para a sala do Atílio. Ele já estava lá desde as 07h00. E não usava terno.
– Onde fica minha mesa? – Perguntou?
– Bom dia, Paulo. Seja bem-vindo!
– Ah sim, bom dia… hã… bom, vamos trabalhar na mesma sala?
– Bom Paulo, ainda estamos nos ajeitando por aqui. Sabe como é seu tio. Me avisou na quinta-feira que você começaria hoje. Ainda estou organizando algumas tarefas pra você.
Paulo ficou um pouco contrariado. Teria que trabalhar na mesma sala do seu chefe e ainda dividir uma mesa com ele? O Márcio não teve que passar por isso. Quando chegou na repartição, lhe deram uma sala, uma mesa, um computador!
– Atílio, onde está o computador?
– Hã?
– O computador. Você usa um pra organizar as contas, não?
– Ah sim… tem um na sala ao lado. Você não está com calor com este paletó?
– Estou bem… bom se há uma sala ao lado, acho que posso me arrumar por ali.
– Paulo, aquela sala é uma sala de reuniões. Utilizamos a sala para receber clientes, fornecedores. Não temos tanto volume de documentos assim que justifique ter um computador para cada um.
“Precisarei mudar muitas coisas aqui”. Paulinho sacou a agenda da pasta e anotou um compromisso para o próximo sábado: ir até Ribeirão comprar um laptop.
– Seu tio não virá hoje de manhã. Foi acompanhar uma entrega em Ribeirão. Se você puder me ajudar com estes envelopes aqui.
– Não vou conhecer os colegas da seção?
– Eu sou seu colega da seção. Aqui na administração, além do seu tio e eu, temos a dona Filó que é nossa secretária e cuida do RH, o Pedro e o Mesquita que são os vendedores externos e raramente estão na empresa, além da dona Gina que cuida do cafezinho e da faxina. Na produção temos o Daniel, o Silvio, o Ataliba, o Donizete e o seu Tobias que cuida das máquinas. O Manoel e seus filhos fazem o transporte das cargas. E agora temos você.
“Isso não está certo… uma única pessoa para limpar e fazer café? O Márcio tinha uma salinha do café. Dona Filó do RH?”
- Depois preciso que você leve seus documentos para que a Filó dê entrada no seu registro. Você pode usar o armário para guardar suas coisas. Tem certeza que não está com calor?
– Fique tranquilo. Acho que você pode cuidar dos envelopes. Vou até o computador para me familiarizar com o sistema de contas.
– Não há muito o que ver. É uma planilha separada por fornecedor, classificada por data do pedido e data do pagamento. Neste momento, preciso separar os cheques por envelope para cada um dos fornecedores. São os pagamentos desta semana. Se você puder me ajudar, depois poderemos tomar um café quentinho.
“Eles não têm um sistema próprio? Em que mundo vivem? O Márcio mesmo já me falou que tem até um login e senha próprio para usar lá na prefeitura”
– Quando o senhor fez faculdade era bem diferente pelo visto…
– Faculdade? Não sei… eu não fiz, sou formado técnico em contabilidade. Você vai me ajudar com os envelopes?
Paulinho deu um suspiro…
Horas depois, Paulinho foi ao encontro de Márcio para almoçarem.
–  Gravata afrouxada? Eu disse a você que o calor era infernal.
– Não é o calor. Eu me demiti.
– Como assim? Você começou hoje!
– Márcio… você está vivendo no paraíso. Eu queria ter é o seu emprego! Você tem uma sala, computador, mesa, sala para o café… Ah, Márcio… você sim tem um emprego bom.
– Você está louco? Você não vai ganhar a mesma coisa que eu, isso é verdade, mas pense bem. Você iria trabalhar até as 16h00 na empresa do seu tio. Teria um trabalho leve, pouca responsabilidade, não precisa usar terno e gravata, pode almoçar em casa todos os dias e poderia aproveitar o tempo livre para fazer outras coisas.
– Márcio…
– Eu fico todos os dias até as 19h00, sou obrigado a usar terno e gravata, tenho que atender o público e posso responder por eventuais omissões. Lá você tem o Atílio para te ensinar tudo. Eu preciso ficar lendo dúzias de manuais e não tenho como recorrer a alguém porque o cara que ocupava o cargo anteriormente, se aposentou e se mudou para Ribeirão.
– Mas Márcio…
–  Não entendo… o meu emprego é como outro qualquer. Você queria o meu emprego? Pois eu queria é o seu emprego! Queria ter esta tranquilidade para poder ter algum tempo pra mim… Afinal de contas, por que você resolveu se demitir? O Átílio é muito rígido?
– Não…
– Eles te obrigaram a trabalhar um tempo sem registro?
– Não…
– Você descobriu alguma falcatrua?
– Não… meu tio e o Atíilio foram coroinhas da igreja… jamais fariam isso.
– Então… o que aconteceu?
– Eles não usam crachás!

7 de abril de 2014

Livre-pensar

Amigos, este post é curtinho e remete ao último, que fala da pesquisa do IPEA. Este Blog nunca aceitou a pesquisa, nem sua pertinência, muito menos sua metodologia e até inferiu que serviria apenas para nos jogar areia nos olhos.

Apesar disso muito se falou, até na novela da Globo. Ou não atentaram para o que atentamos, ou se deixaram levar pela ala radical do movimento feminista, ou sei lá, não pararam para pensar.

Este Blog, como sempre foi nossa bandeira desde a faculdade, onde tudo o que tínhamos era um jornalzinho fotocopiado (mas muito bem editado), é um espaço de livre-pensar. Sempre achamos que basta querer para isto. Livre-pensar é não se deixar levar por modinhas, por ondas, por movimentos que se dizem democráticos mas têm a semente do totalitarismo. Livre-pensar é não ter medo sequer do ridículo de pensar algo sozinho.

Reproduzir ideias ou estatísticas sem crítica é amarrar o pensamento. Pior que isso: em muitos casos, é abdicar do direito de livre-pensar.

O IPEA reconheceu o erro da pesquisa e já publicou a correção. Não se trata aqui de ficar se auto-exaltando. Este "Blog qualquer" não profetizou nada, não adivinhou nada, apenas... pensou. Ficamos felizes sim porque nem foi tão difícil. Mas principalmente porque pudemos exercer na plenitude o dístico de quase 20 anos atrás que acompanhava o nosso periódico, onde se dizia que "o livre-pensar é só pensar".

2014 - Fonte: Rede Globo
Nota do Editor: a notícia que gerou toda a discussão sobre as estatísticas pode ser lida neste link (ou neste link). Posteriormente, o IPEA admitiu seu erro, conforme divulgado pela imprensa.

2 de abril de 2014

Tá legal... Vamos falar da pesquisa do estupro

  "Existem três tipos de mentiras: as mentiras, as mentiras deslavadas e as estatísticas".
Benjamin Disraeli


O assunto ainda rende. Uma pesquisa foi feita pelo IPEA. O IPEA é o Instituto de Pesquisas em Economia Aplicada. Trata-se de um órgão assessor do executivo federal em assuntos econômicos. Seu antigo presidente, Márcio Porchman, foi candidato a prefeito de Campinas nas últimas eleições. O IPEA, como se pode entender facilmente, deve ajudar a presidente e os ministros da área econômica a tomar decisões. Imaginamos que tal instituto faça pesquisa em Economia Aplicada.

Pois muito bem. Semana passada o dito instituto veio com uma pesquisa onde 25 perguntas eram feitas á população que respondia se concordava ou não. A penúltima pergunta dizia "Mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas?" A soma das respostas "concordo parcialmente e concordo" deu 65%. Eu não sei o que diacho isso significa. Ainda mais se formos ver as outras perguntas, como "Homem que bate na esposa tem que ir para cadeia?", que recebeu 91% de respostas concordando, assim como a pergunta "A mulher que apanha em casa deve ficar quieta para proteger os filhos?" recebeu 15% de aprovação.

A primeira das três perguntas aqui citadas é considerada um "outlier data" ou seja, um dado que não bate com os demais por alguma razão e a melhor forma de agir seria retirá-lo dos resultados. Perceba também que a palavra "estupro" não foi usada.

Que o Brasil é um país machista é sabido. Fico imaginando qual a função desta pesquisa de comportamento feita por um Instituto de Economia. Vimos que ela foi feita em julho do ano passado, mas só agora divulgada. Atire a primeira calcinha quem já havia lido uma pesquisa do IPEA antes...

De todo modo ela estava lá, de bobeira. Cá para nós, pela metodologia porca, acho até que nem feita ela foi. Não é possível tanta barbeiragem numa coleta de dados que não se vê nem em um trabalho de iniciação científica de faculdade. O editor deste Blog e eu já organizamos Congressos Médico-Acadêmicos e nunca vimos tais aberrações.

Na semana que (não) foi discutido o marco civil da Internet, e que a CPI da Petrobrás ganhou força, era de interesse do governo que nossos assuntos fossem outros. Enquanto a Copa não chega, vão nos anestesiando com estas pesquisinhas meia-boca. Para terminar, segue abaixo um gráfico acerca das causas dos estupros e dos assaltos, feitos a partir de pesquisa de gente bem mais séria que os capa-pretas do IPEA:
estupro crimes A Cultura do Estupro é resultado da cultura da impunidade

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...