7 de agosto de 2014

Mesmo após o fim, o show tem que continuar, sempre!!!

Imagine que você é um baita músico. Agora imagina que você toca na maior banda do seu país. Imagina também que você e sua banda, acabaram de lançar o disco mais elogiado da carreira e que vocês estão embarcando pra promover esse disco nos EUA, porque na Grã Bretanha não há mais pra onde crescer. Seu disco foi considerado pela imprensa e pelo público o melhor do ano e vocês a banda do ano. Imaginou? Beleza.

Agora imagina que em meio a tudo isso, seu guitarrista base (e principal letrista da banda), tenha sumido antes dessa viagem e nunca mais apareceu (apenas seu carro foi encontrado perto de um penhasco famoso pelos suicídios e o corpo, nada). E ai? O que fazer?

Pois é, esse dilema aconteceu, ocasionado pela situação bizarra e improvável mencionada acima no País de Gales com os Manic Street Preachers em 1995.

Terminar a banda ou Prosseguir sem Richey James? Esse era o pepino que James Dean Bradfield (voz/guitarra), Nicky Wire (baixo) e Sean Moore (bateria) teriam que descascar a partir do sumiço (a polícia nunca achou o corpo e o caso nunca foi encerrado), além de encararem toda a publicidade negativa/curiosidade da imprensa .

Para resolver esse dilema, os 3 se reuniram com a família do guitarrista desaparecido e em consenso resolveram que deveriam continuar. Decidido isso, partiram para o estúdio para gravar o sucessor de "The Holy Bible", o primeiro sem seu principal letrista. Coube ao baixista Nicky Wire assumir este papel.

Toda a atenção da mídia especializada inglesa se voltou para os Manics em 20 de maio de 1996 com o lançamento de "Everything Must Go" (título pra lá de sugestivo, algo como "Tudo tem que continuar" e uma clara homenagem ao guitarrista desaparecido).

A banda, agora um trio, precisa se valer de recursos externos para preencher e dar profundidade ao som. Orquestrações, violinos, teclados, tudo foi usado de acordo com as necessidades e conforme as ideias iam surgindo. Esses recursos, fazem com que os Manics soem mais maduros. Ainda rocknroll, mas diferentes de antes. Estava tudo lá, a voz e a guitarra inconfundível de James, o baixo pesado e os backings vocals de Nicky e a bateria competente de Sean, mas não eram mais os Manics de outrora, foram obrigados a evoluir, a crescer na  marra.

O disco abre abre de maneira quase acústica com "Elvis Impersonator: Blackpool Pier" até que explode em um refrão cheio de guitarras (como de costume) e depois muda novamente quando aparece uma harpa pontuando o fim do refrão.

Nota-se as influências de sempre, o rock dos anos 70 (hard rock e o punk), mas aqui isso é apenas uma afirmação de que mesmo que soassem diferentes, ainda eram rocknroll, provavelmente preparando o terreno para o que vinha na sequência. Em "A Design For Life", orquestrações, violinos, grandiloquência, é o que ouvimos. Uma das mais belas canções que já ouvi na vida. A mistura perfeita do popular e do erudito, sem deixar de ser rock, simplesmente perfeita: letra, guitarras, baixo, bateria, a combinação com os instrumentos eruditos e principalmente a perfeição na voz de James. O single entrou direto no segundo lugar da parada britânica, mostrando que eles estavam ainda mais populares do que antes. "A Design for Life" até hoje é o single mais vendido da carreira do Manics.

Mas é na faixa título que o bicho pega mesmo. Uma homenagem ao amigo desaparecido, de letra sincera, quase como um pedido de desculpas por continuarem sem ele. Aqui também os violinos soam com grande destaque, pontuando toda a música junto com a melodia vocal que é absurda (James cantou demais na gravação desse disco todo, mas nota-se o peso emocional diferenciado nos vocais dessa aqui). Provavelmente o melhor refrão de toda a sua carreira. A música mais emocional e emocionante já composta pelos caras. Embora seja rocknroll é uma canção atípica, quase um encontro das orquestrações de Phil Spector com as guitarras de Neil Young (simples e extremamente melodiosas). Simplesmente um épico.

Foram lançados mais dois singles desse álbum, "Australia" e "Kevin Carter". Esta última foi a canção derradeira escrita por Richie James antes de seu desaparecimento e era uma homenagem ao fotojornalista sul-africano Kevin Carter que foi o primeiro a fotografar na África a execução conhecida como "Necklacing" (a prática de matar alguém colocando um pneu em chamas em torno de seu pescoço) e que havia se suicidado envenado por monóxido de carbono. Uma típica canção dos Manics da época de Richie, rocknroll com um refrão grudento pra ser cantado a plenos pulmões. Outra bela homenagem dos caras. A canção chegou a número nove da parada de sucessos britânica em 12 de outubro de 1996, dando-lhes uma terceira vez consecutiva um hit no top 10.

O álbum foi aclamado pela crítica e pelo público, alcançando o número 2 da parada britânica. "Everything Must Go" recebeu disco de platina duplo (2 milhões de cópias vendidas no Reino Unido). O disco foi também o mais votado em diversas enquetes de melhores do ano em várias revistas e jornais de música.

O Manics viveu seu maior momento até então em fevereiro de 1997, quando recebeu os prêmios de melhor banda e melhor álbum no Brit Awards.

Sou suspeito pra falar do disco e da banda, é uma das minhas preferidas e esse disco é o meu predileto na discografia dos caras (não sai do meu player, e toda vez que começa, fica no repeat por dias). É completo, complexo, popular, erudito, rock, clássico, ou seja, uma fusão de ótimas influências e de um bom gosto fora do senso comum. James Dean Bradfield tem de longe, uma das maiores vozes do rock britânico, sem sombra de dúvidas.

Nesse disco, os caras mostraram a maturidade e a coragem que poucos artistas teriam. Superaram a maior adversidade possível, voltaram e mostraram ao mundo todo o seu talento e relevância. Lançaram mais alguns discos após esse, inclusive um há poucas semanas, o muito bom "Futurology" e ainda estão na ativa fazendo música de qualidade, cheia de conteúdo social e de protesto (foram a primeira banda de fora a se apresentar em Cuba. Nesse dia contaram com a presença do próprio Fidel Castro em sua apresentação, além da maciça e calorosa recepção popular). Agora, só falta uma apresentação por terras brasileiras.

Bom, chega de conversa e vamos ao que interessa, música. O link pra ouvir o disco está aqui. Espero que gostem. Boa viagem!!!

Logo menos, tem mais.

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