9 de outubro de 2013

Pelo meu direito de não participar

O movimento estudantil sempre foi um tabu. Quem não conhece ou nunca participou, fica com a imagem que é vendida pelos meios de comunicação de que são ações orquestradas por partidos políticos. Quem participou, sabe que muitas coisas podem ser discutidas em prol da qualidade do ensino da graduação.
Eu participei por muitos anos do Centro Acadêmico Adolfo Lutz (Centro Acadêmico da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp) e posso dizer que muitas vezes isso é verdade.
Infelizmente em algumas outras, são apenas crianças brincando de agir como gente grande…

Hoje fui até a faculdade. Por estar em férias do trabalho, pude até sair mais cedo e consegui chegar em um horário decente. Fui até o xérox, passei na biblioteca, enfim… consegui levar uma vida acadêmica normal hoje.
Então, as 19h00 dirigi-me para a sala de aula. Um aula inaugural sobre fisiologia vegetal. Estranhei o fato de que a sala estava muito vazia. O motivo logo descobri: estava ocorrendo naquele momento uma Assembleia geral dos alunos do Instituto de Biociências.
Preciso dizer que a USP anda em um momento turbulento. Este ano haverá a escolha do novo reitor e existe uma grande pressão por parte da comunidade para que a escolha seja por voto direto. Além disto, a reitoria permanece ocupada por estudantes e o DCE (Diretório Central dos Estudantes) declarou que os alunos estão em greve.
Dentro da universidade, existem várias instâncias de representação: o Centro Acadêmico é a representação discente em nível de uma faculdade. Teoricamente, todos os alunos de um determinado curso são representados por um CA, seja pela omissão ou pelo voto. Depois, temos a Congregação que é um órgão colegiado que congrega (daí o nome) representantes discentes, docentes e funcionários. Normalmente este órgão é consultivo e tem sua atuação circunscrita à faculdade.
Depois temos o diretório central dos estudantes que funcionaria como um grande centro acadêmico da universidade. Os CA’s podem ou não apoiar as diretrizes do DCE.
E por fim, temos o Conselho Universitário que é a instância máxima deliberativas. Ela também congregas professores, funcionários e alunos, só que considerando o todo, ou seja, a universidade.
Explicado isto – e voltando à minha história – lá pelas tantas um pequeno grupo de representantes do CA da Biologia invadiu a sala de aula, interrompeu o professor e comunicou que os alunos da biologia decidiram em assembleia que estariam em greve a partir daquele momento.
O que me irritou não foi o fato deles declararem greve das aulas. Mas foi a petulância: “nós decidimos, e todos podiam falar lá na assembleia… se vocês não foram, aceitem democraticamente a decisão da maioria, ou se quiserem fiquem cada um aí com sua consciência”.
Não sei em que mundo vive este pessoal do CA da Biologia, mas deveriam saber que uma greve é uma cessação coletiva e VOLUNTÁRIA de uma atividade produtiva qualquer. Funcionários de uma empresa podem cruzar os braços por salários melhores. Uma categoria profissional pode propor uma manifestação por condições melhores de trabalhos. Mas proibir o meu direito de assistir a uma aula na faculdade? Proibir meu direito de ir e vir? Isto não existe em um mundo civilizado.
Além da invasão na sala de aula, os alunos fizeram um panelaço para impedir os professores de continuarem suas aulas. Fizeram também uma barreira humana nas escadarias impedindo o acesso aos laboratórios.
Esses meninos que estão brincando de ser gente grande deveriam entender que a paralização das aulas não resolve a questão em voga (o mecanismo de escolha do reitor). Façam um protesto em frente a reitoria, atraiam a opinião pública por meio de argumentos e não por meio de chavões partidários do tipo “temos que discutir a democracia na usp”, ou “Fora Rodas”, ou “somos todos da biologia” ou qualquer outro apetrecho que não agrega nada em um debate.
Foi uma postura ridícula. Os alunos têm sim o pleno direito de protestar… protestem com panfletos, jornais, debates nas instâncias cabíveis, defendam seus direitos pela via jurídica se necessário, mas jamais, sob nenhuma hipótese proibam o direito constitucional de ir e vir das pessoas.
Quem sai perdendo com a paralisação das aulas são os alunos, pois o calendário fica mais apertado, algumas aulas são literalmente perdidas e a formação fica comprometida.
Querem ser ouvidos? Aí vai uma sugestão… façam um manifesto sobre a questão, publiquem isso no jornal da faculdade, levem à imprensa externa, criem debates, traga a opinião pública para o debate, apresentem alternativas, elejam representantes discentes capazes de argumentar e costurar apoios e alianças nas instâncias coletivas, pressionem a reitoria com propostas e não com ameaças
E principalmente, respeitem a decisão de quem quer apenas estudar. Respeitem o indivíduo… isso com o tempo traz força ao coletivo…
É uma lição básica que qualquer participante de centro acadêmico deveria saber…

2 comentários:

  1. Concordo que a atitude de ontem foi meio exaltada, agimos no calor do momento e a bateria começou a tocar na frente das salas. O que está sendo feito agora é: Os alunos ficam em frente as salas ANTES da aula começar, quando o pessoal começa a chegar eles falam que como OS ALUNOS estão em greve essa aula não poderia acontecer, pois isso acarretaria prejuízo A TODOS os alunos que aderiram a greve, seja porque votaram nela ou contra ela. Claro que teve várias pessoas que votaram contra greve porque acham que há meios melhores de serem ouvidos mas como teve a maioria de votos a favor de uma greve de estudantes, não entraram na aula porque iria prejudicar todo o resto.
    Sobre a questão de uma greve não resolver, na verdade, resolve porque somos uma instituição pública e os docentes não podem simplesmente "ligar o foda-se" se os alunos vem ou não, porque se TODOS pagam pela universidade e não acontece aula, é um problema que merece devida atenção. Uma paralisação é mais que 1 falta e correria pra retomar matéria.
    Acho que o que te deixou mas puto foi o fato de entrarmos na sala, darmos o recado, e depois atrapalharmos a aula. Até entendo que você queria ficar na aula e ninguém está te privando o direito de estudar, mas só não poderíamos ter aula naquele momento, e...sim terá prejuízo sim, igual você falou, claro quem tem, mas vale a pena prejudicar todos que aderiram à greve entrando nas aulas? Está todo mundo ficando sem aulas e todo mundo terá que arcar alguma hora. Acho que não vale a pena ter 5 pessoas na sala e 55 se prejudicar. Vale ?

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  2. Não creio que os docentes ligariam o "foda-se" se entendessem o que está sendo demandado. De certa forma, ontem violaram-se alguns direitos individuais garantidos pela constituição. O direito de ir e vir. O direito de manifestação foi respeitado, mas a custo de violar o direito das minorias.
    Democracia é sim respeitar a vontade do povo. Mas preservando os interesses da maioria sem violar os direitos das minorias. Não acho o motivo apresentado justo para impor uma greve de alunos. Se fosse algo relacionado à segurança, a saúde ou mesmo a qualidade do corpo docente, até acharia justo.
    O direito de greve é assegurado para garantir um direito que está sendo violado. O DCE simplesmente não aceita a decisão do Conselho Universitário e ao invés de procurar uma solução pelo diálogo optou pelo protesto reacionário. Postura esta que está sendo seguida pelo CABio. Como nenhum direito foi violado (ainda), não vejo esta greve como legítima.

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