20 de janeiro de 2014

Do “pancadão” ao “rolezinho”, ninguém entendeu nada ainda

Dar um rolê: dar um passeio, dar uma volta, passear
(Dicionário inFormal)

Brasileiro tem mania de por apelido em tudo o que vê… o escândalo de pagamentos mensais para políticos corruptos ganhou a alcunha de “mensalão”. O grande blecaute por sobrecarga do sistema elétrico no início dos anos 2000 foi chamado de “apagão”. O resultado pífio do Produto Interno Bruto do Brasil ganhou o carinhoso “pibinho”…

E entre “ãos” e “inhos” eis que surge mais um: o rolezinho.

O tal rolezinho virou notícia quando no Shopping Itaquera um encontro marcado através de redes sociais causou um princípio de tumulto no local. Segundo a revista Época:

Foi assim: 6 mil jovens, a maioria deles com idade entre 14 e 17 anos, responderam pelo Facebook a um convite para se reunir e ouvir funk ostentação – variante do ritmo que exalta o consumo e as roupas de grife – no estacionamento do Shopping Metrô Itaquera, em 7 de dezembro (…). Quando a reunião no estacionamento começou, a segurança do shopping tentou dispersar a garotada. Mas eles, em lugar de ir embora, rumaram para o interior do prédio. Quem lá estava pensou tratar-se de um arrastão, e a confusão se instalou. E os brasileiros ouviram falar pela primeira vez do rolezinho, um fenômeno cultural que ocorre rotineiramente na periferia de São Paulo. (…)
in “A origem do rolezinho”, revista Época
(link aqui).

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Durante a semana, surgiram os ditos “especialistas”. Cada um explicava o novo fenômeno cultural do Brasil à sua moda. Até mesmo o Netinho (o cantor… aquele que foi processado por ter agredido sua esposa) que hoje é secretário da igualdade racial na prefeitura de São Paulo deu seu palpite. Aliás, o cidadão foi escolhido para ser o interlocutor da prefeitura com as lideranças do movimento.

Lideranças?

Movimento?

Um fato concreto é que o destaque dado à ocorrência gerou a repetição do tal rolezinho em outras paragens. Em outros shoppings… outras cidades. O tal do rolezinho ganhou status de manifestação cultural. Ganhou status de protesto. O povo clamando por igualdade social.

Protesto?

E alguns partidos políticos, claro, já tentaram obter alguma vantagem política para si. Algo parecido com o que aconteceu com as manifestações de rua do ano passado, onde virou lugar comum dizer que o partido X ouvia o clamor das manifestações.

Ah sim… como se tornou protesto, em alguns momentos, alguns acharam que surgiria então a violência. E a polícia foi chamada.

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Veio então, o pessoal dos direitos humanos… e a briga ganhou contornos sociais: segundo alguns outros especialistas, estas manifestações são o reflexo da voz da sociedade.

Sério mesmo?

Ninguém está entendendo nada. Ninguém tem a menor ideia do que está acontecendo.

O tal do rolezinho, já existia e vai continuar existindo… a diferença é que o meio de divulgação mudou. Antes, o boca a boca das escolas. Hoje, as redes sociais. E como tudo o que vai parar na rede, acaba ganhando proporções maiores.

Junte a isso o fato dos “pancadões” terem sido ´proibidos. O pancadão era literalmente isso: uma aglomeração de jovens para ouvir música (de gosto discutível e em um volume absurdo), paquerar, beber, se enturmar… eu não chamo isto de diversão, mas para muitos deles, esta era a única forma de lazer. Acabaram com o pancadão, restou a ida ao shopping.

Numa cidade selvagem e violenta, onde poucos têm acesso a boas opções de lazer e cultura (e muitas vezes, a falta de acesso se dá pela falta de conhecimento e não pela falta de lugares), o rolezinho é visto por muitos como um programão de final de semana.

Criamos uma juventude desinteressada pelo conhecimento e pela cultura. Criamos uma sociedade que é movida pelo consumo. O tal do rolezinho é só uma pequena demonstração do óbvio… não existe opção para a sociedade que temos hoje: jovens de origem humilde que preferem investir seus ganhos em roupas, gadgets, consumo. Jovens que não estão pensando a longo prazo… jovens que querem viver o agora, o momento. Sem se preocupar com o que farão da vida a partir do dia seguinte.

Se não acredita, pergunte para alguns destes participantes destes rolezinhos se eles se interessariam a uma visita ao Centro Cultural São Paulo? Ou então a uma sessão da OSESP na sala São Paulo de concertos? Ou ainda, um passeio aos parques de São Paulo… opções existem, mas nenhuma delas vai de encontro aos interesses desta juventude.

Enquanto existir uma sociedade vazia como esta… o rolezinho ainda será a opção para diversão.

Até que surja outro “inho” ou “ão” qualquer por aí…

Ah sim… apesar de eu não concordar na íntegra, sugiro a leitura do texto escrito por Ruth de Aquino para a revista Época. Este outro artigo – assinado por Ana Krepp – tenta explicar a mecânica de um rolezinho. Vale a leitura de ambos…

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