9 de novembro de 2018

Palhaços

Há um tango interpretado por Nelson Gonçalves que assevera:

"É um palhaço todo homem que não sabe envelhecer, que não sabe impor silêncio ao maldito coração".
Nelson Gonçalves in “Palhaço” (by Herivelto Martins e David Nasser)

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Pois que envelhecer é se deixar governar não pelo coração, mas por tudo que não é ele: pelas articulações dolorosas, pelos óculos - os quais cada vez mais fundamentais, pelos exames de laboratório que medem nossos parâmetros metabólicos, pelos médicos que nos tratam, cada vez mais novos. Tão moços, pobres moços, estes médicos. Ah, se soubessem o que eu sei.

O cerne do envelhecimento está em se deixar dominar pelo corpo todo e dominar por fim e inauditamente o coração. Durante toda a juventude nos perdemos pelos descaminhos e ditames do infante coração, mas a velhice nos reserva a plenipotência sobre ele, o órgão antagonista do bom senso.

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Impor silêncio às gritarias daquele que nos diz do caminho sempre errado a seguir, que faz com deixemos "o céu por ser escuro", para irmos "ao inferno em busca de luz." Fazer com que se recolha à função de bomba. Entender que sonhos são apenas descargas do inconsciente, que tem sim lá sua importância mas que devem se confinados ao recôndito da noite devendo ser mortos à luz da aurora, eis os imperativos da maturidade.

É lógico que é preciso crer. É preciso crer em Deus, na Redenção, dada pela disciplina, pela renúncia e pelo desapego. A verdadeira paz repousa em nossas mentes e aguarda nossos passos firmes e coesos para vicejar. Basta que não olhemos para trás.

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A Providência nos impôs o nascimento e a juventude, mas nos presenteou com a velhice, onde, fora da contaminação dos sonhos, podemos contemplar, uma vez fartos das nossas, as desgraças do mundo que não nos pertencem.

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